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Plantéis, selecionadores e a produção de touros. - Med. Vet. Fernando F. Velloso (Assessoria Agropecuária)

Genética | 22 de Março de 2011
(Publicado na Revista AG, Março/2010)

A produção de touros tornou-se para alguns produtores uma alternativa para aumentar seus resultados em pecuária de corte, pois é crescente a necessidade de reprodutores e um touro de qualidade pode alcançar ou superar o valor de 3 ou 4 novilhos prontos para abate. Desta forma, um bovino com a mesma idade (2 anos) pode ser comercializado por 3 ou 4 vezes o valor de um outro bovino para o abate. O propósito deste artigo é discutir alguns pontos básicos na produção de genética que parecem estar meio esquecidos ou até desconsiderados por alguns produtores que se aventuram no gado registrado e na produção de touros. 

Os rebanhos registrados, comumente denominados de “plantéis”, devem ser núcleos de animais com produção controlada e com qualidades superiores aos rebanhos comerciais (gado geral). Pressupõe-se que em um grupo de animais que se faz uma boa seleção multiplicando os superiores e descartando os inferiores estaremos avançando a cada geração para animais mais produtivos e eficientes. Como produto final, podemos retirar a parte superior dos machos e ofertá-los no mercado como touros e os demais como bons novilhos. Sendo os touros parte do resultado dos plantéis, eles carrearão bons genes para os produtores de terneiros/novilhos que os adquirirem. 

Existe uma diferença muito grande entre “rebanho registrado” e “rebanho selecionado”. Ter registro genealógico dos animais é simplesmente saber quem é quem e, quem é filho de quem. O registro genealógico é uma ferramenta para nos auxiliar a melhor selecionar nossos rebanhos, mas não é por si só garantia de genética superior. Já, ter um rebanho selecionado é rotineiramente controlar o desempenho dos animais e com esta informação multiplicar o superior e abater o inferior. O próprio nome dado aquele que se dedica a plantéis é “selecionador” e a palavra já diz tudo. Parece simples, mas afirmo que é menos feito do que deveria. 

De outra parte, temos disponível atualmente um ferramental tecnológico que vem a contribuir, mas em alguns casos se sobrepõe ao básico. Dou como exemplo o uso de marcadores moleculares, a ultrassonografia de carcaças, a Transferência de Embriões ou Fertilização In Vitro (FIV). Todas estas tecnologias são válidas, mas em muitas situações recebem mais atenção do que o básico que deveria ser bem feito. Tenha indicadores para seu rebanho, descarte as fêmeas com problemas reprodutivos, descarte as fêmeas com baixa produção de leite, identifique as mães superiores, identifique as famílias mais produtivas. Feito isto, aí sim, vamos pensar em novas tecnologias para multiplicar o conhecido ou para conhecer ainda melhor nosso plantel. No afã da corrida tecnológica, muitos se perdem em meio a tantas opções e não fazem o básico e fundamental em um plantel. 

A função de um plantel é de altíssima relevância, pois os reprodutores distribuídos em diversos rebanhos irão influenciar a formação e desempenho do gado de nosso país. Não esqueça que metade da genética de todo o seu rebanho vem dos touros! Eles são os verdadeiros provedores de genes e de um indivíduo podemos esperar mais de 100 filhos em sua vida produtiva. Divido as responsabilidades de um plantel em três grandes áreas: 

a) Animais eficientes para o produtor – genética de vacas de baixa manutenção e com boa produção de leite, de facilidade de parto, de terneiros com bom ganho de peso, de novilhos com facilidade de apronte (precoces), etc;

b) Animais eficientes para a indústria – genética de carcaças pesadas, de boa conformação, de alta padronização e de boa cobertura de gordura (terminação);

c) Animais que sirvam ao consumidor – somente teremos cumprido com nosso trabalho se o bife que chegar à mesa for macio, suculento e saboroso. Garantir a manutenção e melhoria do produto final é que nos manterá como produtores de gado. 

Observe que são muitas características para estarmos atentos e que muitas delas podem ser até correlacionadas negativamente (ex: vacas de baixa manutenção e carcaças pesadas, indivíduos com grande ganho de peso e facilidade de terminação, etc). Note que a compreensão necessária sobre a cadeia da carne é muito grande e esta conclusão me leva a outra questão: a produção de genética é uma especialização em pecuária, assim como a produção de sementes é uma especialização do agricultor. Aquele que domina a lavoura e tem boa produtividade passa a ser produtor de semente. No caso dos touros não vemos exatamente este cenário, mas sim a forte presença de “novos pecuaristas” que já iniciam a sua exploração com a produção de genética. 

Este processo todo está mais avançado em parte dos países que são fornecedores de genética de bovinos de corte ao Brasil (Ex: Estados Unidos, Canadá e até Europa). Uma das principais razões que indico para este diferencial é o alto custo da mão de obra nestes locais e o conseqüente trabalho direto do proprietário na fazenda. Como o proprietário vive mais o dia a dia do rebanho e seus problemas a seleção acaba sendo mais efetiva. A preocupação com facilidade de parto, temperamento, eficiência reprodutiva e adaptação, por exemplo, são bem maiores, pois além dos prejuízos financeiros envolvidos existem implicações importantes em cuidados, manejo e trabalho com os animais. E quem faz este trabalho diretamente é o proprietário. 

Ainda nos apegamos muito ao visual dos animais, e o fenótipo pode nos dar indicações das virtudes e deficiências dos animais, mas nada melhor que um processo de seleção contínuo e bem feito. Observe que temos que entender a produção de genética com um processo de melhoria contínua e que a continuidade nos trará ganho genético e de fato touros que contribuam com os produtores. Muitos rebanhos podem ser próximos em seu visual e até os touros podem ser parecidos em um remate, mas a segurança para bons investimentos aos compradores de touros virá da confiança no processo de seleção de cada rebanho. Não é de graça que muitos remates tem superado muito a média do mercado de reprodutores, e notem que nestes leilões os animais não são necessariamente os mais pesados da temporada ou os mais premiados, mas sim daquelas criações onde o comprador de touro vê consistência nos conceitos. 

A notícia boa é que o mercado já está valorizando os projetos de seleção sérios e consistentes. As centrais de inseminação usam como critério para escolha de touros mais o perfil dos projetos de seleção do que premiações ou simplesmente o fenótipo dos animais. Observe quantos touros hoje estão nas baterias das centrais em função da identidade com o rebanho de origem e em função de indicadores técnicos (índices, DEPs, etc). 

O mercado de reprodutores é de fato entusiasmante e pode ser uma muito boa alternativa para aumentar a rentabilidade de explorações pecuárias, porém como em todas as áreas da economia o consumidor está mais bem informado e mais exigente (que bom). Fala-se tanto em “agregar valor” e a produção de reprodutores é uma das tentativas de agregação de valor em bovinos de corte. Há um espaço grande para ser ocupado no fornecimento de genética de qualidade, mas genética alicerçada em trabalhos sérios e princípios sólidos em seleção animal. Dito isto: mãos à obra. É hora de selecionar, descartar, multiplicar, acasalar, medir, remedir e assim tomar decisões acertadas para o seu rebanho e para os rebanhos de seus clientes. 

Fernando Furtado Velloso
Médico Veterinário (CRMV RS 7238)
Inspetor Técnico – Associação Brasileira de Angus
Sócio da FFVelloso & Dimas Rocha Assessoria Agropecuária
www.assessoriaagropecuaria.com.br  

(Fevereiro/2010)

Capa_Revista AG_março/2011

Foto: Divulgação/Assessoria