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O ANGUS NOS ESTADOS UNIDOS: sempre aprendendo com a nossa maior fonte de genética.

Genética | 01 de Julho de 2012
(Julho, 2012)
Saudações.

Tive a oportunidade de participar de mais uma gira visitando rebanhos de Angus no EUA. Desta vez integrei o CRI BEEF TOUR e visitamos criadores nos estados de Iowa, Dakota do Sul, Dakota do Norte e Montana. Cruzamos o centro do cinturão do milho e fomos até o norte do país.

Não há como contestar que os EUA é o país mais importante na seleção do Angus no mundo e que nos abastecemos diretamente ou indiretamente desta genética. Usando reprodutores Brasileiros, Argentinos, Australianos ou Canandenses identificaremos influência de genética americana.  Desta forma, o selecionador americano se posiciona como real provedor de genética, e nós Brasileiros, Argentinos e Uruguaios somos quase que na totalidade usuários e multiplicadores deste produto. Aí reside uma grande diferença em termos de seleção animal e de negócios.

A seleção de reprodutores nos EUA sempre teve sua força e consistência em programas objetivos e no uso intensivo de dados (índices de rebanho, DEPs, ultrassonografia de carcaça e mais recentemente dados de eficiência alimentar e marcadores moleculares). Esta regra segue valendo e é muito positiva, pois assim temos reprodutores que são consequência de critérios técnicos e objetivos, porém noto que o bom e velho  ̎tipo ̎ passou a ter mais importância e quem demandou isto foi o mercado. Assim como ocorre no Brasil, a discussão e falta de consenso se o melhor método é a seleção por dados ou por tipo é um assunto frequente e sem consenso entre os criadores. Alguns mais pragmáticos e científicos defendem que o tipo será consequência da seleção por eficiência. Outros mais conservadores (mas não menos exitosos) defendem que o tipo deve ser protegido pela mão humana. Parece-me que o meio do caminho e a combinação de tipo e dados sejam a melhor alternativa e alguns criadores lá estão assim trabalhando. No Brasil, identifico excesso de valorização para o tipo e muitos bons animais sendo subutilizados por não terem a tal pureza racial buscada. Talvez (provavelmente) esteja ocorrendo confusão entre tipo animal e características menos relevantes consideradas de padrão racial. Este assunto merece um outro artigo!

De forma simplificada identifiquei como alguns pilares e diferencias da seleção americana o seguinte:

  1. clareza de objetivos e continuidade disciplinada nos programas de seleção,
  2. uso intensivo de touros próprios,
  3. valorização e mensuração objetiva da eficiência das mães,
  4. investimento pesado em touros pais, e) sistema mais intensivo de produção que acelera os ganhos genéticos;
  5.  informações transparentes, objetivas e disponíveis sobre a genética dos animais aos clientes.

A oferta de novos touros ou animais da moda é cada vez maior e é um fato em qualquer país. O bom selecionador se deixa seduzir pouco por estes modismos e persiste em seu programa de seleção buscando seus objetivos e de acordo com seus critérios técnicos. Notei claramente que muitos criadores americanos estão alinhados com este princípio e aí temos uma lição e um diferencial.

O uso de touros próprios (crioulos como dizemos) é algo que se vê repetidamente em todos os rebanhos visitados. Esta situação que é vista como atraso por alguns selecionadores no Brasil é a demonstração de que o criador acredita no seu programa de seleção e que este busca aumentar a concentração dos genes resultantes de seu trabalho no rebanho. É comum ver nos plantéis americanos o uso de inseminação com um touro e depois o repasse do gado com o mesmo reprodutor. Assim, maximiza-se a produção deste animal e acelera-se a obtenção de informações de progênie. Secundariamente (mas não menos importante) fortalece-se o afixo daquela criação e retém-se valor na operação. Atualmente transferimos muito valor de nossas operações para terceiros (pense nisso).

A base de fêmeas nos plantéis é outro item fundamental e distinto nos rebanhos que visitamos. As melhores mães são selecionadas objetivamente pela avaliação genética americana e denominadas Pathfinder. Resumidamente, estas são fêmeas com no mínimo 3 produtos acima da média da raça para Índice de Peso ao desmama (mínimo 105) e com reprodução regular. Assim são valorizadas fêmeas com eficiência reprodutiva e capacidade leiteira para desmamar um terneiro do lote ponta. Com esta identificação contínua de mães superiores desde 1978 o americano vem construindo um eficiente rebanho de cria.  Muitos bons touros em centrais de inseminação (como diversos que vimos nos criadores e na central da CRI) têm várias gerações de vacas Pathfinder, garantindo assim a consistência genética de sua linha materna. Estas fêmeas são identificadas no registro genealógico e nos catálogos de leilões com um #. Fácil, prático e transparente.

O investimento de altos valores em touros para uso nos rebanhos puros foi outro diferencial importante que notei. Nos deparamos com vários touros em serviço que foram adquiridos pelo preço de 5 a 10 vezes o valor de um bom touro comercial. Esta situação demonstra a real preocupação e atenção que o selecionador americano dá para a genética que usa e de certa forma fortalece muito o negócio de genética por lá.  Visitamos rebanhos conduzidos pela próprias famílias e estes sendo a receita principal (ou única) destas pessoas. Logo, o valor elevado de touros pais de plantel não é um artificialismo de mercado feito por investidores ou novos pecuaristas, mas sim a realidade daquele mercado. 

Nos EUA praticamente a totalidade das operações trabalha com pecuária 1 ano, ou seja, fêmeas que entram em reprodução aos 12 meses e machos vendidos para abate ou reprodução com 12 meses ou pouco mais. Esta situação leva a um sistema que exige mais da genética dos animais, porém onde os ganhos aparecem mais rapidamente, pois o intervalo entre gerações é bem menor que o realizado por nós.

A relação dos produtores de genética com seus clientes é bastante madura e transparente. Os dados técnicos publicados nos catálogos de leilões são bem compreendidos pelos produtores e o posicionamento dos animais conforme o seu rankeamento na raça para tal característica também é um facilitador (ex: TOP 1% para Peso ao Nascer, TOP 5% para Leite, etc). Um exemplo simples e prático que vimos num rebanho em Montana foi a identificação dos touros de venda com duas cores de brinco: amarelos para touros com facilidade de parto e brincos brancos para touros sem facilidade de parto, mas com alto ganho de peso. Assim oferece-se um serviço simples de orientação ao cliente.

A genética americana é criticada por muitos criadores no Brasil por considerarem que há excesso de alimentação em comparação a nossa realidade e porque os animais são considerados grandes. De fato, em todos os lugares que visitamos o gado estava em boa ou ótima condição corporal e é reservado muito alimento para os períodos de neve ou falta de pastagem. Aí vêm as reflexões: seleção se faz dando condições de desempenho aos animais ou com restrição alimentar? Conseguiremos identificar as diferenças genéticas dando condições de saúde ao gado e onde as vacas produzem leite ou em condições de períodos (longos) de fome? Em relação ao tamanho do gado (ou frame) também ocorre a crítica de que os animais são demasiados grandes, mas estes são mesmo tão grandes ou crescem porque não sofrem restrição alimentar como os nossos?

A visita ao Schaff Angus Valley (afixo SAV) foi um capítulo a parte de nossa viagem. Este rebanho se tornou nos últimos anos o mais importante e influente do mundo Angus. Hoje, inquestionavelmente, este é a genética mais usada entre os criadores de gado puro e a sua genética tem alcançando muitos países via inseminação ou através de touros desta origem. O rebanho de fato impressiona muito quem gosta de bom gado, se encontra muita padronização e fêmeas com tipo muito definido da marca SAV: compridas, femininas, volumosas, de bons úberes e aprumos corretos. Em fevereiro de 2012 ocorreu o 109° leilão desta fazenda e foram vendidos 440 touros Angus com média de 12 mil dólares. Parece que o trabalho está sendo bem feito.  


Fernando Furtado Velloso
Médico Veterinário (CRMV RS 7238)
Inspetor Técnico – Associação Brasileira de Angus
Sócio da Assessoria Agropecuária FFVelloso & Dimas Rocha

(Julho, 2012)