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Criação de ovelhas junto a olivais cresce no Rio Grande do Sul

Informação, Mercado | 11 de Fevereiro de 2019
Consórcio entre a criação de ovinos e a produção de frutas e azeite está sendo experimentado em propriedades gaúchas e vem demonstrando potencial para deslanchar

Duas atividades econômicas, uma recente e outra consolidada há bastante tempo nos campos gaúchos, começam a interagir no Rio Grande do Sul: a olivicultura e a ovinocultura. A integração ainda é tímida, mas seu potencial é tido como grande. As diversas vantagens apontadas pelos produtores que já experimentam este sistema levam a crer que a “parceria” irá deslanchar em pouco tempo, na medida em que os olivais entrarem na fase “adulta”.

Alguns projetos já conseguiram harmonizar a recente plantação das oliveiras com a tradicional criação de ovelhas. Há também vários produtores de olho nestas experiências, aguardando resultados mais concretos, para embarcar no mesmo negócio. Pesquisas em andamento e a observação em campo começam a indicar o melhor manejo para tirar das duas atividades o melhor rendimento.

A aposta nesta integração se dá por diversos motivos. A relação é de ganha-ganha, acreditam os envolvidos. Os ovinos se beneficiam do conforto da sombra das oliveiras e pastam nesta área mais “protegida” sem compactar o solo. Em contrapartida, geram esterco (adubação) para o olival e fazem roçada natural da área. Sendo assim, é dispensado o uso de máquinas e combustível para a limpeza do olival. A roçada natural também substitui a aplicação de herbicidas, gerando economia. De uma mesma área, o produtor consegue extrair a azeitona, o azeite de oliva, a lã e a carne.

O presidente do Instituto Brasileiro de Olivicultura (Ibraoliva), Eudes Marchetti, vê com entusiasmo esta parceria entre as culturas. “Ao mesmo tempo em que há redução de custos de produção, com menos interferência de agrotóxico e menos horas de uso de máquinas, há aumento de renda”, avalia. “É um consórcio muito saudável. Se ganha na qualidade das azeitonas e na engorda desses animais”, acrescenta.

Para o presidente da Associação Brasileira de Criadores de Ovinos (Arco), Paulo Schwab, o sistema de produção é “muito interessante” do ponto de vista econômico, especialmente para as pequenas propriedades. “Uma atividade não atrapalha a outra e permite ao produtor ter renda ao longo de todo o ano”, afirma. Schwab considera ainda que este consórcio poderá ser um impulso para o aumento do plantel de ovinos no Estado, que vem caindo nas últimas décadas. De acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o efetivo do rebanho do Rio Grande do Sul recuou de 11,2 milhões de cabeças em 1980 para 3,4 milhões em 2017.

No entanto, a integração das duas culturas não está cem por cento chancelada. Ainda é grande o campo a ser explorado pela pesquisa. Há alguns problemas que precisam ser minimizados para um convívio sem danos aos animais e às plantas. Experimentos dos produtores apontam que quando o olival é jovem aumentam as chances de ataque dos ovinos às árvores, que ainda são pequenas, têm a copa muito baixa e tronco “macio”.

Em função disso, o agrônomo Vinicius Brignol Leite, que trabalha na Estância Guarda Velha, produtora do Azeite Batalha, em Pinheiro Machado, diz que o segredo é acertar na escolha da raça que será integrada ao olival. Ele recomenda também que o produtor comece a fazer este consórcio a partir do quarto ano de implantação das oliveiras, quando o tamanho das plantas impõe dificuldades para os animais comerem as folhas. Outra recomendação é que o produtor não deixe faltar pasto embaixo do pomar. O pesquisador da Embrapa Clima Temperado, Enilton Coutinho, ressalta, ainda, que é importante haver um pastor responsável por vigiar o rebanho e um rodízio nas áreas que disponibilizam pastagem e gramíneas.

Para eliminar a possibilidade de ataque ao olival, empresas privadas em parceria com olivicultores têm desenvolvido um equipamento – uma espécie de “focinheira” – para as ovelhas. Segundo Marchetti, este trabalho ainda está em fase de testes, mas os resultados obtidos até o momento indicam que será uma alternativa viável. Ao mesmo tempo em que impede o ataque à planta, a focinheira não prejudica a alimentação do animal. “Estamos acompanhando o comportamento e a pesagem dos ovinos que estão usando o equipamento e até o momento não houve nenhuma influência negativa”, revela. Marchetti comenta que, uma vez consolidados os dados destes testes, o Ibraoliva recomendará o uso da “focinheira” e a integração das culturas. A previsão de lançamento desta tecnologia é ainda para este semestre.

O veterinário Renato Pulz, que ministra aulas de Ética e Bem-Estar Animal na Ulbra, diz que desconhece a “focinheira”, mas defende estudos detalhados sobre a inserção de equipamentos como este. “Vale lembrar que os ovinos, por características da espécie, não demonstram facilmente sua dor, desconforto e estresse, podendo os sintomas serem subestimados”, alerta.

Convívio adequado no quarto ano

Na Estância Guarda Velha, produtora do Azeite Batalha, em Pinheiro Machado, os olivais começaram a ser implantados em 2010, em uma área de coxilha que era usada para a criação de ovinos. Para isso, na época, foi necessário reduzir o rebanho. Três anos depois, em 2013, começou a experimentação do consórcio reunindo as duas atividades. No início, o convívio não foi muito pacífico. O agrônomo responsável, Vinicius Brignol Leite, conta que, num primeiro momento, houve uma tentativa de integração utilizando-se a raça de ovinos Highlander. “Mas elas tinham um temperamento mais agitado e comiam a casca das árvores e as folhas”, lembra.

Para viabilizar o sistema de produção, decidiu-se então substituir a raça. Alguns testes depois, a estância conseguiu acertar o manejo com a Corriedale e a Ideal. “Como a Batalha prefere a produção de carne do que de lã, se optou por criar Corriedale embaixo do olival”, pontua Leite. O agrônomo explica que, além de acertar na escolha de uma raça de temperamento mais dócil, o produtor precisa aguardar pelo menos até o quarto ano do pomar para introduzir o rebanho na mesma área. Leite afirma que o produtor pode aproveitar os três primeiros anos para fazer melhoramento do solo, utilizando forragem de boa qualidade. “Neste período, fazemos feno e silagem para obter renda e ajudar no custeio do olival”, ensina. Depois, no quarto ano, a área estará mais fértil e preparada com pastagens para a entrada dos animais.

Atualmente, na Guarda Velha, já há 400 hectares plantados com oliveiras. Em 150, circulam 1 mil ovinos, em sistema de rodízio. Quando começa a faltar pasto em uma área, os animais são transferidos para outra. Uma das principais vantagens desta parceria, na opinião de Leite, é a economia de combustível e horas-máquina. As ovelhas praticamente eliminam a necessidade de roçadas mecanizadas.

Menos agrotóxico. Na avaliação de Eudes Marchetti, presidente do Ibraoliva e diretor geral da Tecnoplanta, dona da marca de azeite de oliva extravirgem Prosperato, um dos grandes benefícios deste sistema de produção é a suspensão do uso de herbicida no pomar. “Não compactuamos com a utilização de agrotóxicos”, frisa Marchetti. “Então, para nós, ter integrado a ovelha ao pomar foi uma alternativa ambientalmente correta”. Marchetti conta que testou o uso de gado de corte na integração, mas não recomenda a experiência.

Os primeiros experimentos com ovinos, há seis anos, foram com a raça Texel. Agora, a Tecnoplanta cria a Corriedale, que se adaptou melhor. Em Barra do Ribeiro, pouco mais de 50 ovinos pastam embaixo de um pomar de 75 hectares. Em São Sepé, cerca de 200 ovelhas circulam por um olival de mais de 120 hectares, também da Tecnoplanta. Marchetti diz que todas as experiências feitas até o momento, referentes aos pomares e à integração com outras culturas, foram bancadas pelo setor privado. “Cada empresa monta sua equipe, viaja para o Exterior para conhecer os projetos lá fora, para analisar o que eles estão fazendo”, diz. “Temos no Rio Grande do Sul condições de cultivo muito diferentes das da Europa, por exemplo, então precisamos de mais estudos, mas as empresas públicas de pesquisa, infelizmente, ainda têm dados muito precários”.

Testes avaliam a “focinheira”

Nas propriedades da Tecnoplanta, as ovelhas servem como cobaias para os testes das “focinheiras”, equipamentos que impedem os animais de comer folhas e frutos e roer o caule das árvores. As empresas desenvolvedoras farão lançamento da ferramenta neste semestre e preferiram ainda não divulgar imagens. Eudes Marchetti, diretor geral da Tecnoplanta e também presidente do Ibraoliva, conta que, nos últimos meses, a “focinheira” foi sendo ajustada para não trazer nenhum prejuízo ao bem-estar animal.

Também na fazenda Mato Grande, em Canguçu, de onde sai a matéria-prima do Azeite Verde Louro, há experimentos com a “focinheira”. Segundo o auxiliar administrativo da fazenda, Romário da Silva, esta técnica mostrou ser eficiente. “Vem rendendo excelentes resultados”, afirma, destacando que, enquanto a fazenda economiza com roçadas, fatura com a venda de carne, lã e cordeiros.

Na fazenda Mato Grande, a implantação dos pomares começou em 2010. Atualmente, o olival já tem 300 hectares. Em 2015, foi dado início à integração com as ovelhas visando redução de custo com as roçadeiras. Segundo Silva, hoje, são mais de 500 animais espalhados no olival mais “adulto”, sendo usadas de 8 a 10 ovelhas por hectare. “Tendo espaço no pomar para este número de ovelhas, você pode deixá-las em tempo integral, sem necessidade de remoção”, avalia. No verão, Silva diz que as ovelhas se alimentam com pastagem natural e ervas daninhas que surgem no solo. No inverno, quando diminui a oferta de pasto, é semeado o azevém no campo.

“Vejo benefícios mútuos”, diz produtor

Muitos produtores do Estado que ainda não consorciam a olivicultura e a ovinocultura estão de olho nas experiências que começam a se consolidar. Ovinocultor há 10 anos, José Alfredo Buss, de Canguçu, implantou um pomar de oliveiras há dois anos. Assim que o porte das árvores permitir, pretende investir na integração. “Estive em encontros técnicos com produtores que fazem o consórcio e eles me incentivaram”, relata. “Vejo que tem benefício mútuo para as culturas.”

Buss possui hoje 220 animais e diz que no momento em que poderá usar a área de olivicultura recém plantada para pastagem, estuda aumentar o plantel. “Vamos ver o que esta área do olival vai oferecer de pasto aos ovinos, porque a limitação é sempre o alimento”, pondera. Neste meio tempo, buscará pesquisar mais sobre a possibilidade de doenças que a ovelha pode desenvolver neste sistema de produção.
O veterinário Renato Pulz, que ministra aulas de Ética e Bem-Estar Animal na Ulbra, recomenda que os produtores sempre optem por acompanhamento técnico. Ele aponta que, para os animais, por exemplo, pode não haver maiores riscos se ingerirem folhas das oliveiras eventualmente, na falta de pasto. Mas o consumo em excesso pode causar distúrbios digestórios.

Sobre a utilização da “focinheira” nos ovinos, Pulz lembra que é importante que não cause sofrimento físico ou psicológico ao animal, nem impeça que expresse seu comportamento natural. Desta forma, entende que o mais prudente seria aprofundar as pesquisas sobre o uso dessas ferramentas. Lembra ainda que os problemas de convívio no olival podem ser contornados com oferta contínua de pastagem de boa aceitabilidade pelos animais e a lotação adequada no piquete.

Avanços em alta velocidade

Enquanto os produtores vão acertando o manejo para trabalhar com oliveiras e ovinos em um sistema de integração, os pomares vão se alastrando no Rio Grande do Sul e dando respostas positivas quanto à produção. A aptidão dos campos gaúchos para a olivicultura começou a despertar o interesse dos produtores e ganhar escala comercial há 10 anos. Apesar de novatas, há marcas de azeites de oliva extravirgem gaúchas que colecionam premiações em concursos de destaque mundial.
O presidente do Instituto Brasileiro de Olivicultura (Ibraoliva), Eudes Marchetti, diz que o tamanho dos olivais cresce todos os anos. Na atual safra, o Estado conta com 5 mil hectares de oliveiras plantados. O cadastro olivícola feito pela Secretaria da Agricultura em 2017 mostrou que, naquele ano, os principais municípios produtores eram Canguçu, Encruzilhada do Sul, Pinheiro Machado, Cachoeira do Sul, Sant’Ana do Livramento, Bagé, Caçapava do Sul e Barra do Ribeiro. Segundo o coordenador da Câmara Setorial da Olivicultura da Secretaria da Agricultura, Paulo Lipp João, há mais 200 produtores em mais de 70 municípios gaúchos.

No restante do país, especialmente Minas Gerais e São Paulo, o cultivo ocupa outros 4 mil hectares. Marchetti acredita que a cultura alcançará 30 mil hectares no Brasil até 2025. Na safra de 2018/2019, que será a maior da década, a produção nacional deve ultrapassar os 200 mil litros de azeite de oliva, sendo 150 mil provenientes do Rio Grande do Sul. Na comparação com o ciclo passado, a produção irá dobrar, já que novos pomares tornaram-se produtivos.

Este volume representa apenas 0,3% do consumo nacional, segundo o Ibraoliva. “Temos um enorme potencial para explorar”, projeta o presidente da entidade. Com boa visibilidade, os azeites gaúchos saem em vantagem na relação com os importados por chegarem bastante frescos às prateleiras dos mercados e lojas especializadas. Segundo Marchetti, em uma semana é possível colher e processar as azeitonas, embalar o produto e distribuir. “Diferentemente do vinho, quanto mais jovem o azeite for consumido, melhor”, indica.

A colheita desta safra no RS começa neste mês. A Abertura Oficial da Colheita da Oliva ocorre em 15 de março, na propriedade de Arno Werlang, em Formigueiro.

Assista ao vídeo clicando aqui.


Fonte: Correio do Povo

Criação de ovelhas junto a olivais cresce no Rio Grande do Sul

Foto: Correio do Povo

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Foto: Correio do Povo

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