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Venda de Reprodutores: fabricante ou lojista?

Genética, Informação, Mercado | 15 de Julho de 2021
Por Fernando Furtado Velloso
Assessoria Agropecuária FFVelloso & Dimas Rocha

A comercialização de reprodutores é tema permanente em meu trabalho, seja nas rodas de conversas com os clientes, na assessoria aos leilões, na busca de animais para compra, na revisão de touros para centrais de inseminação, nas minhas leituras e, inclusive, nos estudos de meu curso de pós-graduação. Assim como a venda de gado comercial para engorde ou abate tem as suas características, desafios e conflitos, a comercialização de reprodutores tem as suas particularidades.

Recentemente, fiz uma viagem rápida passando por três produtores de touros do RS (Planalto), PR e SP. Nas pausas para o mate ou café, as conversas caíam nas questões da compra e venda de reprodutores: “tive frustração com tal fornecedor, comprei vacas prenhes e acabei tendo que receber sêmen para compensar as vazias nos lote, não acho apropriado a venda de vacas registradas ‘servidas’ somente, não quero mais comprar matrizes cobertas fora da estação, depois que algumas vacas pariram, percebi que era um lotinho de animais bem ruins de leite e vão desmamar bezerros bem fraquinhos por aqui, o pessoal compra fêmeas de outro pecuarista faz o ‘registro base’ e oferta nos remates sob o guarda--chuva de sua marca conhecida, centenária, etc.” As situações relatadas são as mais diversas e não estão centradas em discutir se este tipo de produto pode ou não ser vendido, especialmente em leilões, mas se a colocação no mercado desta mercadoria está alinhada em favorecer o acerto do cliente ou não.

Fabricante ou lojista?

Tentando discutir e avançar nesse assunto, comentei com o cliente no Planalto do RS: no negócio de reprodutores, temos perfis bem diferentes de vendedores, desde aquele que é muito dedicado a fábrica até chegar naquele que é só dedicado a loja. Os mais empenhados na fábrica estão dedicados na eficiência da produção, na seleção dos melhores animais, no descarte de possíveis problemas (para si e para os clientes). Ao final, o produto deverá auxiliar no acerto do cliente. Os que têm mais afinidade somente com a loja acabam dedicando bastante tempo e energia na busca do novo cliente, na divulgação da sua marca, na realização de mais um leilão, em aproveitar os bons momentos do mercado. Se o produto é o ideal ou não é tema secundário. O mercado é livre, as informações estão disponíveis e os compradores que façam as suas escolhas. A venda de touros muito jovens e leves, de matrizes somente servidas ou prenhes fora de estação, de animais que tiveram histórico reprodutivo ruim, de matrizes “veteranas” misturadas no lote de vacas de “meia idade”, etc. Todas essas situações ocorrem, não são proibidas ou algo parecido, mas estão naquela fronteira ou linha (nem tão imaginária) de onde acaba o tipo de produto que ajuda o cliente ou o atrapalha.

As empresas falam de venda técnica e de consultor de vendas, pois o objetivo é melhorar o resultado do cliente. Se sabemos que a raça A ou B não é mais indicada para algumas regiões ou situações, deveria ser o nosso dever orientar o nosso cliente que nos pede esse produto por ser novo na atividade ou por desinformação.

A satisfação do cliente é que leva a longevidade dos negócios e a fidelização dos compradores. A afirmação não é nova e serve para todas as atividades. Porque seria diferente em touros e matrizes?

• A melhor propaganda é feita por clientes satisfeitos (Philip Kotler);
• Um cliente satisfeito é a melhor estratégia de negócios (Michael Leboeuf);
• Se você vende algo para alguém, você tem um cliente hoje; se você ajuda alguém, você tem um cliente para a vida toda (Jay Baer);
• O propósito de um negócio é conquistar clientes que conquistam clientes (Shiv Sing);
• O único centro de lucros é o cliente (Peter Drucker);
• Todo mundo tem clientes, só traficante e analista de sistemas tem usuário (Bill Gates).

Em outras conversas com os produtores de touros do PR e SP ambos me comentaram dos seus bons índices de recompra de touros, ou seja, de clientes que retornam ano a ano para repor seus touros. Até da situação bastante frequente de clientes já nem vão mais revisar os animais e pedem que o vendedor escolha os animais na fazenda ou os lotes do leilão. Aí chegamos nos conceitos que os gurus da administração e marketing repetem faz tanto anos: foco no cliente. Se possível, “encantamento” de clientes. Aí é bonito, é como água morro abaixo, é um Dodge nas baixadas, é artilheiro pedindo música no Fantástico.

Na maioria das fazendas, as vacas tem a cola cortada no diagnóstico de gestação. Ficam de cola aparada (curta) as vacas prenhes, as que permanecerão no rebanho de cria. Ficam de cola inteira as vacas falhadas, e que provavelmente serão vendidas gordas para abate. Na visita que fiz no Planalto do RS, o produtor me comentava da preocupação dele em vender reprodutores e matrizes que sejam de fato bons aos clientes. Refugo eu vendo pra abate, não tenho pena, me disse ele. Sejam novilhas, vacas falhadas ou problemáticas eu aparto e vão pro confinamento. Já comprei vacas de cabanhas conhecidas que chegaram aqui por prenhes e não pariram, recebi doses de sêmen para compensar o atrapalho, fiz várias inseminações sem sucesso, insisti em mais um entoure porque a “genética” me interessava. Depois, cansei e mandei elas pro confinamento também.

Não quero mais ver essas coludas na minha frente!

* Publicado na coluna Do Pasto ao Prato, Revista AG (Julho, 2021)


Venda de Reprodutores: fabricante ou lojista?

Foto: Divulgação/Assessoria