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A escolha da semente é a chave do negócio

Genética | 13 de Novembro de 2021
Meu avô, Serafim Cardoso, era um pecuarista muito dedicado. Com visão clara da pecuária, sabia o que estava fazendo. Formou três rodeios de vacas definidas, de três raças diferentes. Charolês, Angus e Devon (bem, nesse lote entravam touros vermelhos Red Poll, Shorthorn, Hereford). Em 1974 com esses rebanhos constituídos ele conseguiu, com um sobrinho seu, touros “mineiros” (Zebús que eram trazidos de Minas Gerais) e cruzou com as vacas europeias. Não é necessário dizer que foi um sucesso total o resultado desse trabalho. Mais adiante, quando ele se ausentou houve um período que quem tomou conta dos manejos foi o seu encarregado. Só que aí durante esse período, se perdeu a orientação dos cruzamentos e virou uma salada de frutas porque os touros foram acasalando ao acaso.

Passados 8 anos, quando iniciei na atividade, em 1982, ao fazer o levantamento do rebanho, consegui identificar mais de 40 tipos diferentes de acasalamentos, tendo como base o Charolês, Angus, Devon, Shorthorn, Red Poll, Nelore, Jersey e Holandês... sim, porque as vacas mansas também entraram na conta...

Desse rebanho extraímos vacas que os técnicos credenciados das Associações de Charoles, Angus e Ibagé selecionaram, separamos do gado geral e voltamos agora a organizar o gado de cria com três núcleos de vacas, reconstituindo o rebanho Charolês e Angus e a novidade era o Ibagé.

Isso me proporcionou um episódio interessante, alguns anos mais adiante, quando um lindeiro combinou comigo que queria escolher um touro para repor no seu rebanho. Chegou o dia, fomos a cavalo no rodeio, orgulhosamente apresentei a “tourada” ao nosso mais novo cliente... todos filhos de inseminação artificial ... Ele revisou todos, três raças disponíveis. Conversamos bastante. Elogiou os animais, etc. Perguntou as condições do negócio e o valor dos reprodutores. E então fez a pergunta mais intrigante: - “Seu Fernando... se o senhor fosse descartar um touro desses, aquele que menos lhe agrada ... qual seria?”

Eu tinha 25 anos de idade, e o meu cliente já ia com quase 70 anos de vida, sempre na lida campeira. Fiquei sem saber o que dizer com o questionamento e sem a percepção necessária do momento (falta de prática), mostrei um touro que eu menos gostava. Calmamente ele me fala: -“Pois eu me interessei nesse touro ... quanto o senhor faz esse touro para mim?” Acabamos fazendo negócio, apartamos o touro do rodeio e ajudamos a tirar no corredor ...

A vida é um aprendizado constante...

Agora vejamos como age um produtor de soja, ou milho, ou trigo, ou cana, ao buscar a semente para a sua lavoura. Normalmente esse produtor sabe do custo de produção da sua atividade. Sabe do cronograma de plantio e de colheita. Sabe do comportamento climático e das suas variações e riscos. Sabe da sua capacidade de plantio e colheita. E sabe que tipo de lavoura ele quer produzir e como será a tecnologia para o feitio da lavoura. A partir de suas necessidades, ele vai em busca das variedades que melhor se adaptem ao seu ambiente e dentre essas vai escalonar algumas variedades que lhe permitam plantar e colher no tempo adequado, com maiores chances de sucesso na safra.

Será que esse lavoureiro, ao buscar a semente, irá abrir mão de uma semente certificada? Será que ele irá buscar aquela semente de saco branco, mais barata? Justificaria ter um investimento em toda infraestrutura, equipe de trabalho, máquinas, fertilizantes e demais insumos e buscar a economia ao comprar a semente?

Eu diria que os programas de seleção existentes, funcionam como a “classificadora e a mesa de gravidade” que buscam padronizar a semente a ser oferecida para o melhor plantio. Ao regular a classificadora, as sementes que caírem na bica da limpeza, são excluídas do processo produtivo, porque são insuficientes. Não garantem êxito no empreendimento. Isso tudo precisa ser melhor entendido também pelo pecuarista, para que faça sucesso em sua pecuária. Traçar metas, buscar um objetivo, se enquadrar em um perfil de produção, (o melhor possível para a sua condição), entender o que o mercado quer e o que pode ser feito para maximizar o produto que será oferecido no futuro ao mercado, para que ele lhe dê o melhor retorno com o investimento que foi feito.

A tecnologia empregada na seleção de animais já é muito avançada. Além da seleção visual (fenotípica), também se utiliza a seleção por desempenho e qualidade de carcaça, devidamente medidos pela balança e por ultrassom. E para consolidar esses resultados, a genômica está sendo cada vez mais utilizada pelos selecionadores e dessa forma permite se ter certeza de que determinados animais podem ter um desempenho superior a outros em função da bagagem genética que eles levam.

Seria interessante para o criador, passar a pensar no seu rebanho. Qual a principal característica que precisa corrigir para evitar prejuízo? Por exemplo... vaca que tranca bezerro. Existem touros que são indicados para minimizar a ocorrência de distocias. Ou então, gostaria de aumentar o aleitamento para os bezerros, para desmamá-los mais pesados ... é possível escolher um touro que vai melhorar a produção de leite das suas filhas em relação às vacas do seu rebanho. E assim por diante. Se a proposta é produzir bezerros meio sangue de alto desempenho em confinamento e com carcaça de alto rendimento, com marmoreio, também pode ser encontrado. Veja os nossos reprodutores, da Fazenda Santa Cecília, que estão disponíveis nas centrais de comercialização de sêmen... (só uma dica...)

Lembre-se, os filhos de determinado reprodutor, se forem machos, ficarão no máximo 3 anos na propriedade. Mas as filhas desse mesmo reprodutor, podem ficar até 14 anos... (exagerei?) Se a vaca for eficiente ótimo, mas se for uma vaca de pouca produção ou de pouca qualidade, serão anos a fio...até que ela seja substituída.

Hoje já temos como buscar o touro que vai concertar o que não está bem. Basta procurar no lugar certo. E o lugar certo é buscando as informações que os programas de seleção disponibilizam online para qualquer pessoa, em consulta pública, gratuita 24hs por dia, na internet. Busque o site da ANC com os resultados do Promebo (https://sistema.herdbook.org. br/publico/consulta-animal) ou do Gensys com o programa Natura (https://gensys.com. br/consulta-publica/) e faça a pesquisa. Ou então consulte os Sumários Online, nos mesmos sites. Se tiver dificuldade em entender, procure o setor de fomento da Associação Brasileira de Angus.

Aqueles produtos que não estiverem listados nesses dois sites, provavelmente são oriundos de propriedades que não participam de programas de seleção, e aí mora o risco. São as sementes do saco branco, ou o touro escolhido por meu lindeiro. E o tempo vai mostrar que o barato acaba saindo bem caro.

Por: Fernando Gonçalves
Fonte: Angus News (Outubro/Novembro 2021)

A escolha da semente é a chave do negócio

Foto: Associação Brasileira de Angus