Foto: Divulgação/Assessoria
Pelo hábito da curiosidade e da escrita, tabulei, faz poucas semanas, os touros Red Brangus disponíveis nas centrais de inseminação. Leia-se disponíveis nos seus catálogos, leia-se nos seus sites. Cheguei a uma lista de 45 touros. É muito? É pouco? Não sei responder, mas fiquei surpreso, pois sempre ouço que o Red Brangus vende pouco sêmen no Brasil. Imagine só se vendesse bastante. Seriam 100 ou mais touros no balcão. Fique feliz de ver que metade, aproximadamente, são touros brasileiros. O Red Brangus, me parece, é um produto para mercados “regionais”, provavelmente mais para o sul do Brasil. Para uso em novilhas e vacas Red Angus, Hereford, Braford, etc. Enfim, criadores que buscam manter a pelagem vermelha do gado.
Poucos dias depois de pensar sobre essa lista de touros, decidi participar da I Gira Brangus Uruguai. De Porto Alegre a Durazno são 800 km, mas, aproveitando a cruzada por nosso campo em Livramento, não fica tão longe. A respeito do que se fala e do que se faz no Brangus brasileiro eu já estou um pouco inteirado. Ver e ouvir o que se faz e o sobre o que se fala no Brangus uruguaio poderia ser uma chance de novas visões.
No Brasil, vejo os selecionadores de Brangus num dilema de foco: produzir o melhor Brangus para a vaca zebu e F1 Angus x Nelore ou o melhor Brangus para as vacas Brangus e taurinas dos rebanhos de cria do Sul do País? Atender às duas frentes com o mesmo produto não me parece simples ou viável. O Brangus que mira os zebuínos é ferramenta de cruzamento terminal. O Brangus usado em rebanhos de cria, no sul, deixará filhas na reprodução, participará da eficiência do gado de cria. São necessidades em genética bem diferentes.
O Brangus do Uruguai não deve estar muito preocupado com as vacas Nelore do Brasil. Talvez tenha mais proximidade com o Brangus que o RS necessita do que alguns nossos. “Pah”, lá vem o Velloso usar o Uruguai como modelo de pecuária de novo. R.: Não é por aí, mas tudo bem. Vamos adiante.
Participei, então, no final de julho, da tal gira no Uruguai. O Brangus vermelho que citei no início do texto é o produto preferencial por lá, diferente do Brasil, onde o preto é majoritário, especialmente na inseminação artificial. Os criadores uruguaios que têm gado base Hereford buscam mais o Red Brangus para manter a cor no gado. É uma infidelidade menos dolorosa, menos pública. É um motel mais discreto, com bastante cerca verde no seu entorno.
A demanda por touros Brangus no Uruguai parece ser bastante forte. Consultei alguns consignatários que estavam presentes no evento e eles me confirmaram que o Brangus é bem mais expressivo que o Braford. Consultei também sobre eventuais restrições do mercado a esse produto com influência de zebu. Entendi que é algo que já ocorreu e hoje é fato superado. O carrapato e a necessária maior adaptação ao meio são vozes mais fortes que a imagem da carne produzida somente com raças britânicas.
Visitamos os rebanhos El Trafoguero e El Coraje nos dois dias de gira, ambos na região de Durazno. O primeiro é um selecionador mais novo na atividade, mas usa a raça em seu plantel controlado e também no seu gado comercial. O segundo é, provavelmente, o rebanho mais importante da raça no país.
Em relação ao El Coraje, cabem algumas considerações. Sem ter visitado antes esta cabanha, fui formando uma opinião um pouco incorreta, muito baseado nas falas de outros: “o gado é muito pequeno, tende ao nanismo, não tem crescimento. É um tipo de gado só pra campo muito pobre, pra uma pecuária de fome. Não cabe nas necessidades da Fórmula 1, que é a grande pecuária brasileira, etc.”.
Já no início de minha visita, percebi que a história que me venderam (ou que eu comprei) não batia bem com o que comecei a ver e ouvir por lá. O rebanho El Coraje está em um propriedade de bom porte (aproximadamente 2,2 mil ha em área própria e arrendada) e tem um sistema de produção bastante intensivo, com áreas de agricultura (produção de grãos e sementes) e uma pecuária de ciclo curto, expondo todas as novilhas à reprodução com 14 meses, nos últimos 15 anos. Em nossa visita de campo, revisamos um lote de 250 terneiras (novilhas de ano) que entrarão na cria na próxima temporada. Na apresentação de doadoras, revisamos matrizes com peso que variava de 600 a 750 kg, não sendo assim tão “nanicas” como eu esperava, mas, seguramente, eram matrizes de porte pequeno ou médio e muito boas. O foco desse selecionador é bem claro em animais com baixo peso ao nascer (preferencialmente abaixo de 30 kgs) e com alta precocidade, porém não são animais sobreviventes dos sistemas tradicionais que vendem imagem de rusticidade. São animais expostos a um sistema alimentar intensivo, que permite serviço de “precocinhas” e venda de touros de dois anos com, aproximadamente, 700 a 750 kg. Somados aos reprodutores para venda no remate anual, foram também produzidos, em 2022, 1.000 embriões (FIV) e 100.000 doses de sêmen para o mercado nacional e exportação.
No Uruguai, existem também a produção e o registro de animais UltraBlack, permitindo a produção de reprodutores do cruzamento de Brangus com Angus. No caso da El Coraje, os touros Angus usados são dos rebanhos argentinos Don Manue (preto) e La Esencia (vermelho), ambos com muito foco em animais de porte pequeno e alta precocidade. Se o direcionamento para esse biotipo de animais é o melhor caminho, é outra discussão, mas é inegável que o foco está presente e é perseguido. Não é somente um dizer de expressões repetidas em materiais promocionais.
Voltei do Uruguai animado com a viagem que fiz e com as possibilidades do Brangus para o Sul e para o grande Brasil. Gostei do gado que vi e das lições que aprendi. – Mas, Velloso, o gado não é muito pequeno pra nós? R.: Talvez sim! Se é necessário mais frame para corrigir a recria com dois invernos de restrição alimentar, esse gado não é boa opção. Mas, talvez seja o porte exato, se essa genética for usada em sistemas mais intensivos de produção, onde a precocidade sexual e a facilidade de engorde são necessárias.
* Publicado na coluna Do Pasto ao Prato, Revista AG (Agosto, 2023)