Em meu trabalho de mestrado (2022) foram analisados cerca de 60 leilões do Rio Grande do Sul, que ofertaram mais de 4.000 touros. O objetivo era avaliar a disponibilidade de informações nos catálogos e o nível tecnológico do produto touro. Entre as conclusões, ficou bem claro que muitos vendedores informam menos sobre os seu touros do que poderiam. Em 2025, vemos ainda catálogos similares aos de 20 ou 30 anos atrás. São pouco informativos: resumem a genealogia em pai e avô materno; restringem os dados do reprodutor ao peso e PE na data da venda; e a avaliação genética a poucos índices ou DEPs. Uma linha basta para descrever um produto que levou três anos pra sair do ventre da vaca e ir para o mercado.
As informações omitidas ou supersimplificadas levam à perda de diferenciação do produto. Sem a possibilidade de diferenciação, o comprador usa como régua comparativa os poucos dados disponíveis. Tendem a ser melhor vendidos os mais pesados, bonitos, fotogênicos e de índices maiores. E assim seguimos numa corrida por mais peso nos touros (mais custo e menos funcionalidade).
Subestimamos a capacidade e interesse do comprador. Já ouvi tantas vezes: “Não adianta informar muitos dados. A maioria dos compradores não entende”. E assim seguimos numa “dinâmica quase estática”: não informamos porque muitos não entendem, e, com o pouco que informamos, poucos aprendem a entender. Sem informar detalhadamente as características do produto, reduzimos as chances de um touro muito diferenciado ou especializado ser percebido pelo cliente.
Números que igualam diferentes
Os índices são números gerados pelos programas de melhoramento que nos ajudam a agrupar touros inferiores, medianos e superiores em diferentes fases da sua vida (desmame, final, carcaça etc).
Os “melhoristas” discutem a melhor forma de incluir e ponderar diversas características em um índice só. Juntam várias DEPs diferentes e geram um número novo. Uma concha de feijão para o ganho de peso, uma colher de sopa para a conformação, uma colherinha para a precocidade e uma pitada para o temperamento. Misture tudo e está pronto o Índice de Desmama. Pode não ser o melhor “chá” para quem busca mais do que uma “colherinha” de precocidade.
Os índices não são maus na essência, mas reúnem, sob o mesmo número, biotipos e curvas de crescimento distintos. Na mesma gaveta ou percentil (ex: Top 20%) podem estar animais bem diferentes. Um com mais peso e menos gordura, outro com mais músculo, gordura e menos peso. É parecido com a média e o álcool: devem ser usados com moderação.
Detalhar não é confundir
O agrupamento por característica principal ou indicação clara de lotes por sua especialidade (uso em novilhas, terminação em confinamento, qualidade de carne, resistência ao carrapato etc) dão suporte técnico e espaço para a valorização do animal especifico para o cliente específico. As listas com touros especialistas são uma rotina nos catálogos de centrais de inseminação, mas ainda são raras em catálogos de leilões. Já pensou em fazer uma listagem dos seus touros, agrupados por indicação principal, no início ou fim do seu catálogo?
Dar destaque a lotes especiais não deveria ser somente promoção (marketing), mas sim um modo de valorizar animais que diferem bastante do produto médio do leilão. Se um catálogo deve ser bem informativo, um lote destaque merece mais detalhamento. Na verdade, bem mais detalhamento. Já escrevi sobre alguns leilões de Angus que participei nos EUA, onde os touros com brinco branco eram indicados para novilhas e os demais tinham brinco amarelo. É outra forma simples de reforçar uma informação e facilitar a vida do comprador. A informação ou orientação técnica não precisa estar só na forma de texto.
Existem várias maneiras de melhor informar e descrever um touro num catálogo: agrupando os animais por famílias ou linhagens, em touros para cruzamento ou raça pura (sim, eles são diferentes), em touros maternais ou terminais... As características maternais são bem específicas e importantes para o cliente que retém as filhas do touro na cria. E vejo muito pouco (ou nada) neste sentido nos leilões que frequento. Provavelmente, não é o mesmo touro Top 1% de algum IQG.
No negócio de reprodutores, vejo (e ouço) vários vendedores insatisfeitos com o pouco reconhecimento da qualidade e valor de seus touros. A lamentação é um pouco repetitiva: “tal touro era muito superior aos outros da geração, mas o comprador não valoriza”. Porém, vejo poucas ações para mudar a forma como os animais são informados e detalhados nos catálogos de venda. É tempo para diferenciarmos touros que não são iguais. É tempo para melhores catálogos.
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* Publicado na Coluna "É só olhar e ver", Revista DBO (Junho/2025)