Por Fernando Furtado Velloso
Assessoria Agropecuária FFVelloso & Dimas Rocha
Saudações! Pertenço ao grupo dos apreciadores de dias de campo, giras, jornadas técnicas etc. Não é de hoje. Desde o tempo de minha graduação eu acompanhava as páginas rurais dos jornais buscando alguma atividade assim. O Correio do Povo sempre prestou um bom serviço nessa área informando a agenda rural de qualquer “fundão” e lá íamos nós para um dia de campo de gado de leite, de desmame, de reprodutores, de pastagem... Rateava-se a gasolina, pedia-se pouso em algum parente ou amigo, mate novo, pneu meio liso (mas bem calibrado) e pé na estrada! Tive bons parceiros da Favet/UFRGS nessas empreitadas: Daniel Pinto (Mapa/PR), Daniel Caldart (Frigorífico Independência, por vários anos), Marcelo Selistre (ABS), Julio Martino (Bayer), Gustavo Winter (professor da URFGS), Fernando Gonzales (cirurgião de equinos), Otávio Cunha (médico de gente, cirurgião). Tantos outros foram parceiros nessas viagens, mas não estão mais na memória RAM do escritor.
Depois de formado, tive a oportunidade de participar de diversas viagens técnicas internacionais, principalmente com as empresas de genética (centrais de inseminação), mas também com criadores e associações de raça. De todas voltei sempre convicto: não há melhor argumento em prol de uma raça ou projeto do que “ir a campo”, mostrar in loco, e assim trazer mais adeptos para uma raça ou técnica de produção. Muitos ainda pensam que a melhor estratégia sejam as exposições. Nessas já fui muitas vezes, por ofício ou por querer, e muitas foram proveitosas e outras muito pouco. Perdoem-me os aficionados pelo show, mas já fui mais, hoje sou menos. Quanto mais distante, menos sou entusiasta; mas quando vou a alguma exposição, ainda me cutuca o prazer de ver bons animais e das surpresas e causos de um julgamento.
Deixando de lado os saudosismos e as tantas histórias que gosto de lembrar, trago neste texto algumas reflexões sobre os resultados das “giras” (visitas a vários produtores) comparados às exposições. Ou, talvez, um formato combinado como pude participar da Jornada Técnica 2018 – Brangus Sul (maio), que propiciou dois dias de gira e um dia de exposição ao final, contemplando assim interesses e perfis distintos de participantes.
As giras são mais convincentes. Não tenho mais dúvidas. Os animais, as raças e os cruzamentos são apresentados como são e onde são produzidos. O desempenho dos animais está ali para ser visto e combinado com as informações recebidas nos resumos das estações (potreiros, campos e por aí vai) ou nas tantas informações oferecidas pelos técnicos e proprietários dos estabelecimentos. Na maioria das visitas que já fiz, incluindo as recentes da Jornada Brangus, realizadas no dia 1, na Estância Três Marias (Celso Rigo) e na Cabanha São Rafael (Nelson Mariano da Rocha), em São Borja. Na primeira, conhecemos parte de um rebanho de cria numeroso padronizado na raça Brangus. No segundo, conhecemos o plantel de seleção de reprodutores Red Brangus da família Mariano da Rocha. Neste rebanho, foi produzido o Grande Campeão da Expointer 2017 (MR Gango). No dia 2, visitamos Santiago: a “Lavoura de Carne”, na Estância Santa Marta (EBA Agropecuária), onde vimos um sistema superintensivo de recria e engorda comparado ao usual no RS: pastagens irrigadas por pivô em sistema de parcelas/pizza, pastagens com alta carga animal, com suplementação e confinamento. Ainda no mesmo dia, conhecemos um novo projeto de genética Brangus, com aproximadamente 50 produtos de embrião da parceria de André Callegaro e Ignácio Tellechea. Em apenas dois dias, vimos muita coisa, aprendemos bastante, trocamos muitas ideias e saímos cheios de dúvidas e novos projetos possíveis. Observou-se o desempenho do Brangus em situações de produção muito distintas: cria comercial, engorda intensiva e seleção de reprodutores. Ficou fácil compreender os méritos e desafios da raça Brangus.
Lamento informar, mas as exposições são muito bonitas e tudo mais, porém, não têm o potencial agregador e de convencimento que as giras de campo possuem. O objetivo do expositor é vencer. O objetivo do anfitrião em uma gira é compartilhar. São coisas muito distintas. O expositor quer mostrar a superioridade de seus exemplares. O anfitrião, além de abrir as porteiras de sua propriedade, tem compartilhado as suas “perdidas” também. Fiquei muito bem impressionado em ver nesta última jornada os produtores informando as suas dificuldades, suas frustrações, as suas limitações (em reprodução, em ganho de peso, em seus controles, comercialização etc.). Nos diversos depoimentos que ouvimos nas diferentes fazendas, sempre nos compartilharam suas dificuldades e algum baixo desempenho inesperado. Essa abertura de informações é que permite a melhoria para todos.
As giras de campo são a real “mostra” de como os animais desempenham em diferentes ambientes e sistemas de produção. Lá se vê muito mais do que os animais, mas também o ambiente, os recursos humanos e parte do processo de seleção e de produção.
As exposições são só uma “amostra” do que de melhor pode ser produzido no rebanho “a” ou “b”, mas não são um espelho ou referência do produto médio daqueles produtores.
Mas, Velloso, por que esse assunto novamente? Tu és contra as exposições?
Nada disso! Simplesmente estou com o assunto quentinho na cabeça e quis compartilhar.
Pensando em trazer novos criadores para uma raça ou novos usuários para os reprodutores selecionados, não tenho dúvidas que as atividades de campo, desde dias de campo em um local só até Jornadas Técnicas com várias visitas são os melhores argumentos para arrebanharmos mais sócios para uma entidade ou mais clientes para os reprodutores.
Deixo o desafio e o convite para os que não têm participado dessas atividades: vá a uma gira técnica na sua região, viaje mais longe e vá para outro estado. Dê um passo mais longo e vá em uma viagem técnica no exterior. Depois de participar de algumas dessas jornadas, responda a pergunta que segue:
E onde será que a genética mora? No campo, nos rebanhos, nos processos de seleção vistos em uma jornada técnica ou nos “predestinados” que estão nas exposições?
* Publicado na coluna Do Pasto ao Prato, Revista AG (Junho, 2018)